Durante muito tempo as estatísticas educacionais apontaram para um grande entrave para o aumento da escolaridade da população – a evasão. Por outro lado pesquisas internacionais e nacionais apontaram para outro problema do fluxo escolar – a repetência
A falta de escolas para o segundo seguimento do 1º grau e a idade avançada dos alunos em relação à série que cursavam, conseqüência das múltiplas reprovações, problema vivido por décadas pelos alunos brasileiros e, de forma mais acentuada pelos alunos oriundo de família de baixa renda, fez com que a escolaridade da população sempre estivesse em patamares insuficientes e elevassem as desigualdades de oportunidades e disparidades regionais quanto às realizações educacionais .
Tais problemas resultaram no baixo nível de escolaridade como sendo uma herança( maldita) passada de geração a geração, ratificando características indesejáveis que persistem no cenário educacional brasileiro:
a)o nível educacional médio da população é baixo; b) a educação está desigualmente distribuída; c) existe uma correlação alta entre as realizações educacionais das crianças e as de seus pais e avós, indicando a ausência de igualdade de oportunidades; d) há grandes disparidades regionais nas realizações educacionais das crianças. (Barros e Lam, 1993)
Com o atendimento praticamente resolvido no Brasil, a grande desafio que se impõe é o da qualidade – significando aprendizagem. Temos convivido, ainda com altíssimas taxas de reprovação e baixos níveis de desempenho detectados, respectivamente, pelo Censo Escolar e pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica.
Mesmo neste cenário desigual temos experimentado, nas últimas décadas, uma melhoria sensível nos indicadores educacionais, fruto da expansão do atendimento na área: diminuição nos índices de analfabetismo, crescimento no número de matrículas em todos os níveis de ensino, aumento das taxas de escolaridade, dentre outros. Tais melhorias têm sido imputadas ao investimentos e atenção dada à área pela esfera governamental, mostrando claramente uma tendência unilateral na explicação para tal fenômeno.
Alguns estudos já apontam outros fatores para progressão educacional brasileira destacando desde a demanda familiar pela educação como também a urbanização e a transição demográfica no Brasil, ou seja, atribuem o crescimento positivo dos indicadores à melhoria das condições das famílias quanto aos recursos disponíveis para educação dos filhos.
Quando considerado o impacto da transição estrutural, da transição demográfica e da urbanização das últimas décadas podem ser distinguidas três dimensões principais: a primeira e mais estudada é a dos recursos econômicos ou capital econômico- quanto maiores os recursos disponíveis também maior será a demanda pela educação dos filhos; a segunda é a dos recursos educacionais ou capital cultural – o meio ambiente cognitivo na família; e a terceira diz respeito aos próprios arranjos familiares ou ao capital social- função e aspectos da estrutura familiar, observados pelas relações estabelecidas entre seus membros.
A terceira dimensão estabelece o contexto no qual os capitais econômico e cultural dos pais são convertidos em desempenho escolar das crianças, funcionando como um filtro para esses outros capitais. Vale destacar, ainda, o caso das famílias monoparentais, bem como das famílias com numerosos filhos pequenos, em idade escolar, em que ocorre uma diluição da atenção prestada pelos membros adultos às crianças (Coleman, 1988:111-113), interferindo diretamente no desempenho escolar. Por outro lado, como conseqüência da queda da fecundidade, tem ocorrido uma redução significativa no tamanho médio das famílias e no número de filhos, constituindo uma situação mais favorável à educação das crianças.
Consideração igualmente relevante deve-se à educação materna, não somente pelo seu efeito direto sobre a escolarização das crianças, mas também pelo fato de a educação das mães estar inversamente relacionada ao número de filhos (Lam, Sedlacek e Duryea, 1992). Ao mesmo tempo, cresce a inserção das mulheres no mercado de trabalho com possíveis efeitos negativos na escolarização dos filhos e situação desfavorável à infância conseqüência, também, do número de famílias chefiadas por mulheres. A maior estabilidade familiar propiciada pelas uniões legais se traduzem um melhor desempenho educacional de crianças e jovens (CEPAL, 1993).
Sendo a educação um elemento importante para favorecer o êxito na sociedade, a escola então é responsável pela seleção e socialização dos jovens e consequentemente pela estratificação social, considerando, também a origem dos alunos. Porém seletividade escolar é fortemente influenciada pela características que transversalizam as características sociais e econômicas de modo que a chances de sucesso são potencializadas por aqueles com maiores aspirações profissionais, com maior capacidade cognitiva, com famílias ( monoparentais ou não), amigos, professores que estimulam a se desenvolverem.
Tal situação também pode ser observada quando comparada as características dos indivíduo à entrada e à saída do sistema educacional. Os ‘ amortecedores’ da origem social do aluno o são de tal maneira a ponto de diminuir ( e até neutralizar) o seu efeito sobre o desempenho e a progressão escolar.
Sendo assim o desempenho cognitivo do aluno - função central da escola- é influenciado por fatores intra e extra-escolares. Não há ênfase em um fator isoladamente, pois nenhum, por si só, garante sucesso escolar, mas o conjunto deles. Fatores associados aos alunos, suas famílias, seu grupo social são especialmente importantes pois suas condições econômicas poderão facilitar seu acesso a bens culturais, a uma maior intervenção dos pais em suas tarefas e auxílio, bem como potenciaizar expectativas. Fatores internos à escola – gestão pedagógica e escolar, expectativa em relação aos alunos, igualdade no tratamento...serão determinantes no sucesso ou fracasso de crianças e jovens.
Eis o nosso grande desafio – tornar a escola pública cada vez mais eficaz e mais equitativa na produção do aprendizado de todos os seus alunos, para compreender a relação entre as diferentes dimensões presentes no cotidiano educacional e uma sociedade com condições menos desiguais pode ser um bom começo para transformar estruturas e mentes arcaicas.
Referências
1) Recursos familiares e transições educacionais
Nelson do Valle Silva &Carlos Hasenbalg: 1 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 18(Suplemento):67-76, 2002
2) A pedagogia da repetência
Sergio Costa Ribeiro – estudos avançados, 1991
3) Tendências da Desigualdade Educacional no Brasil
Nelson do Valle Silva & Carlos Hasenbalg: Dados, Vol.1, n.3, RJ:2000